"Renascence", podemos dizer, é a obra-prima de Waldemar Bastos: “representa o amadurecimento absoluto da minha música. É mais profundo e maior. Não consigo pensar em quaisquer outras palavras. É uma síntese da minha vida. Eu derramei a minha alma neste disco.”
Na avidez das primeiras audições, destaco pessoalmente dois temas, "Pitanga Madurinha" e "Sabores da Terra", que me arrebataram e fizeram estremecer a alma e os sentidos. Deflagrou a tal identificação/conexão de sentimentos entre o autor e o fruidor da obra de arte. A beleza criadora de um é revivida pelo outro, reflectida no outro. "Renascence" é um disco de pormenores para descobrir e deliciar-se progressivamente. E no fim surge um bónus: uma versão mais viva e ritmada de "Kuribota", a minha preferida do álbum anterior. Obrigado Waldemar.
Tive o privilégio de conversar e estar com Waldemar Bastos, quando esteve na Madeira, pela primeira vez, em 1998. É de trato simples, muito aberto e caloroso. A sua presença na Região deveu-se a uma iniciativa da Casa da Cultura da Calheta e do seu coordenador Luís Guilherme Nóbrega, que organizou duas semanas muito especiais dedicadas à cultura africana: música, pintura, prosa, poesia, declamação e dramatização. Voltei a estar com ele quando de um concerto, que apanhei por acaso, em 2000, no belo Castelo de Bragança.
Waldemar Bastos, destacado músico angolano no campo da World Music - recebeu um grammy quando lançou "Pretaluz/Blacklight", surge com um novo álbum, "Renascence", depois de um hiato de sete anos. Se seguir o link neste "post" pode escutar parte das canções no sua página electrónica.
Sendo universal (“não é um disco africano e não é um disco europeu; no entanto, é ambos ao mesmo tempo e muito mais, é universal”), a sua música é dominada pelas sonoridades africanas, cruzando-se com sonoridades afro-cubanas e do mundo da Lusofonia, incluindo Brasil e Portugal .
Em "Renascence" ouvem-se sons exóticos vindos do oriente, Turquia, inseridos com pertinência: “Eu sabia que era possível fazer estas conexões”, disse Waldemar. “Sempre adorei as qualidades melódicas da música turca e sabia que era uma junção perfeita”.
Dirigido pelo produtor e programador, da Jamaica e do Reino Unido, Paul 'Groucho' Smykle (Gregory Isaacs/ Bad Audio Dynamite/ Black Uhuru/ Baaba Maal), "Renascence" foi gravado na Espanha, Alemanha, Turquia e Londres.
NOTA BIOGRÁFICA
Nascido na fronteira de Angola com o Congo, em 1954, Waldemar Bastos começou a cantar e a fazer música muito cedo. “Cinco séculos de colonização levaram a que crescesse a ouvir muitas canções de muitas culturas diferentes”, explica. Além dos sons africanos que, naturalmente, absorvia de todo o ambiente que o rodeava, ouviu muita música brasileira e cita os Beatles, Nat King Cole, os Bee Gees e Carlos Santana como as suas primeiras influências não-africanas.
Mas, com a guerra pela independência a intensificar-se, Angola não era um sítio fácil para viver. Ainda estudante, Waldemar foi detido e preso, sem qualquer razão, pela policia secreta colonial portuguesa. Após Angola, por fim, conquistar a independência, em 1975, uma sangrenta guerra civil tomou conta do país. Waldemar, relutantemente, concluiu que este não era um ambiente propício ao desenvolvimento e crescimento de um músico e, numa visita a Portugal, em 1982, decidiu não regressar.
Nos anos seguintes, viveu exilado na Alemanha, França e Brasil, onde gravou o seu primeiro álbum, Estamos Juntos, para a EMI-Odeon. Em 1985, assentou com a sua família em Lisboa, onde gravou o seu segundo álbum, Angola Minha Namorada, em 1990. A este, seguiu-se Pitanga Madura, em 1992.
Foi então que o ex-vocalista dos Talking Heads, David Byrne, comprou por acaso um dos discos de Waldemar numa discoteca lisboeta. Fascinado com o que ouviu, localizou o cantor e contratou-o para a sua editora, a Luaka Bop, em 1997; o resultado foi o premiado álbum Pretaluz/Blacklight, produzido por Arto Lindsay. O disco firmou-o na cena internacional da world music e, desde então, Waldemar fez digressões pela América, Europa e Extremo Oriente.
Em Abril de 2003, regressou a Angola, pela primeira vez em muitos anos, para actuar no estádio nacional da capital, Luanda, numa celebração pelo fim de anos de guerra civil. “Regressar foi a chave para este álbum, porque foi a primeira vez que vi paz no meu país e esperança e fé no futuro na cara das pessoas. Foi nesse momento que ouvi a voz do meu espírito a dizer-me para fazer este disco”.
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