«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

quinta-feira, março 30, 2006

45. Estado de medo


Ilustração: capa de um livro de Michael Crichton


Depois de algumas análises feitas em "posts" recentes deste blogue, nomeadamente a propósito do persistente anonimato na blogosfera madeirense ou do estado da Madeira, um artigo de opinião publicado hoje na imprensa (seguir link para texto completo) glosa o tema, que está, pelos vistos, na ordem do dia.

O mais preocupante é quando o medo está dentro da cabeça das pessoas, em que a autocensura e o autocontrolo extremos são um sintoma. Por mais condicionantes que se possam invocar, cada indivíduo tem uma palavra a dizer, tem autodeterminação, no sentido de estar disposto ou não a abdicar da sua liberdade e vontade própria. E abdica-se porque se pensa no interesse («bem-estar») individual, algo que domina a nossa sociedade, sobretudo os medrosos.

Quanto ao referido texto de Carlos Pereira, eu não me ficaria por colocar as culpas, basicamente, no status quo, enquanto "bicho papão". Se este alimenta o medo, o medo também o alimenta e engrandece. Parece que os medrosos gostam dessa condição. Habituaram-se a estar, comodamente, de cabeça baixa, curvados, cautelosos, amedrontados, tristonhos. É o seu estado natural, é a sua "felicidade".

Numa palavra, é tão culpado o "bicho papão" como o "papado", isto é, aquele que se deixa "papar" pelo medo. Que se resigna e conforma. Porque vivemos num Estado Democrático e de Direito, não esqueçamos. Não aceito que se resignem e conformem com desculpas, por mais relevantes que sejam. Como alguém disse, quem está disposto a trocar a sua liberdade por um pouco de segurança não merece a liberdade nem a segurança que tem.

A minha admiração vai para aos homens e mulheres sem medo, completamente livres, dispostos a pagar um preço, se necessário, porque a liberdade, a coluna vertebral, não tem preço. Ficam uns excertos do artigo do Carlos Pereira:

«Se a critica é a base da democracia, como dizia Octávio Paz em "Um planeta, quatro ou cinco mundos", o medo é a sua patologia».

«Infelizmente, a democracia na Madeira tem muito pouco de exercício de crítica e goza de excesso de medo. O corolário deste binómio é uma ostensiva limitação das liberdades individuais, com reflexos óbvios na qualidade de vida dos cidadãos e, sobretudo, na sua dinâmica social.»

«Pode até ser que este comentário seja mais um lugar comum do nosso quotidiano. Mas é esta a realidade que convivemos diariamente, afectando as nossas vidas pessoais com mais ou menos intensidade, na proporção dos graus que estamos dispostos a prescindir da nossa liberdade

«Este fenómeno, cujos culpados têm rostos conhecidos e estão claramente identificados por todos, conduz a que a maior parte de nós, mais cedo ou mais tarde, tenda a acreditar que o comportamento que maximiza o nosso bem-estar é o da auto censura, única estratégia capaz de evitar problemas. Para isso, ignoram-se princípios de racionalidade e suspende-se deliberadamente a intervenção social.»

«Poucos escapam a esta inevitabilidade. Menos ainda têm consciência das consequências deste comportamento. Na verdade, não existe um sentido claro da importância de intervenção das pessoas, do peso do seu papel nos mecanismos de equilíbrio da sociedade. No fim, fica um espaço fértil para um verdadeiro estado de sítio...»

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