«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Professores de luto e em luta 29: não manipulem a verdade dos números

Santana Castilho desmonta campanha de números (e ódio) contra os professores do país.

Já em 06.11.2006, no Público, Santana Castilho, professor do Ensino Superior, afirmara que os vencimentos líquidos dos docentes «em início de carreira são cerca de 760 euros, 1000 ao fim de 13 anos de serviço, 1400 ao fim de 23 anos de trabalho» e que «com 30 anos de serviço chegam aos 1700 euros». Serão este valores escandalosos? Para quadros de formação superior? Para ensinar e educar? Para uma profissão de elevado desgaste?

Sob o título "o que eles não dizem...", no Público de 20.11.2006, o mesmo articulista desmontou/desmascarou leituras parciais (enganadoras) sobre os supostos vencimentos milionários dos professores, alvo de notícia a propósito de um estudo da OCDE. Estamos perante uma operação deliberada, preversa, direi mesmo criminosa, contra os professores. Essa operação teve por objectivo apresentar os professores portugueses como os mais bem pagos da Europa.

Vejamos então a verdade além da propaganda, da mentira e da demagogia (o artigo de Santana Castilho, apesar do desafio do autor, não foi desmentido pelo Governo, Ministério da Educação ou por articulistas/personalidades ao lado das posições do actual Executivo):

«(...)
1. Nos últimos tempos disse-se, citando a OCDE e para os denegrir, que os professores portugueses eram dos mais bem pagos da Europa. O que permitiu a notícia, glosada até à náusea, foi um gráfico que se refere apenas aos professores do secundário com 15 anos de serviço, em função do PIB por habitante, que é dos mais baixos da Europa. Na mesma página, logo por cima do gráfico utilizado, está outro, bem mais relevante, que ordena os professores em função do valor absoluto do salário. E nesse, num total de 31 países estudados, os professores portugueses ocupam a 20.ª posição! Mas, sobre isto, nada se disse!

2. Disse-se, aludindo ao mesmo estafado indicador, que somos dos que mais gastamos com a educação. Mas não se disse o que importa: que o dinheiro efectivo gasto por aluno nos atira para a 23ª posição entre os 33 países examinados e que, mesmo em relação ao PIB, estamos, afinal, num miserável 19º lugar.

3. Disse-se que a prioridade das prioridades era a qualificação dos portugueses, mas não se disse como se concilia isso com o corte de 4,2 por cento na educação básica e secundária e 8,2 por cento no ensino superior. Como tão-pouco se disse, do mesmo passo, que os subsídios pagos pelo Estado a alguns colégios privados cresceram exponencialmente, de 71 a 108 por cento, como se retira da matéria publicada no DR de 16 de Outubro!

4. Disse-se, ainda, alto e bom som, que os funcionários do Estado estavam mais bem pagos que os privados. Mas não se disse que um estudo encomendado pelo Ministério das Finanças a uma consultora internacional (é moda agora adjudicar a consultoras externas e pagar-lhes a peso de ouro aquilo que os técnicos dos serviços sabem fazer) concluiu, e por isso foi silenciado, que os funcionários públicos ganham, em média, muito menos do que ganhariam se fizessem o mesmo trabalho para um patrão privado. E estamos a falar de diferenças que são, diz o estudo, de 30, 50, 70 ou mais que 100 por cento, em desfavor do funcionalismo público. Isto não se disse! As cerca de 300 páginas deste estudo estão, prudentemente, silenciadas na gaveta de Teixeira dos Santos.

5. Igualmente silenciados, porque não convém que se diga, estão os dados do Eurostat que mostram a inutilidade das medidas da ministra da Educação para a área: o abandono escolar precoce passou dos 38,6 por cento do ano passado para os 40 por cento deste ano, enquanto diminuiu por toda a Europa.
(...)»

Artigo completo anexado na zona de comentários, no post anterior: Professores de luto e em luta 28: patalogia da verdade única e do vale tudo

6 comentários:

  1. Para infelicidade de todos nós, portugueses, os nossos salários são TODOS inferiores (em valores absolutos) aos dos nossos colegas europeus.
    Felismente que são todos, caso contrário corriamos o risco de ter de usar o nosso salário português para pagar salários europeus aos professores. Ridiculo.

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  2. É um grande avanço ter-se já ultrapassado a falácia de que os professores portugueses eram os mais bem pagos da Europa...
    (Falácia não inocente - teve como objectivo verter inveja sobre os supostos salários milionários dos docentes e legitimar certas medidas.)

    Ora, se os salários dos professores deste país não são, afinal, europeus, não se está a usar o «salário português» de ninguém para pagar «salários europeus aos professores», como refere. (Sobre a leitura de que os professores suposta e indevidamente viveriam à custa dos outros portugueses não merece comentário.)

    Além do mais, o problema não é só de salário. É de condições de trabalho, que estão ligadas, quer se queira quer não, às condições de ensino-aprendizagem dos alunos. Mas, isso já não interessa ver...

    TODOS os portugueses com salários inferiores aos europeus? Parece que não...

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  3. Quanto á melhoria das condições de trabalho, para os professores e para os alunos, concordo em absoluto consigo.
    Onde a nossa opinião diverge é no facto de eu considerar que há professores que não merecem aquilo que ganham e outros que mereceriam muito mais, e que esse facto tem reflexos directos no desempenho de todos os professores e no nivel geral dos nossos alunos.

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  4. Trabalhadores menos empenhados e competentes há em todas as profissões, mas nunca são uma maioria.

    Os casos mais graves e reincidentes devem ser identificados e resolvidos sem contemplações. Quanto aos outros, uma avaliação formativa e estimulante da melhoria, em lugar da punição pura, serviria melhor o sistema de ensino. De que serve punir no salário e na carreira se o trabalhador não melhora, se não sobe a produtividade? Se um professor menos competente ganhar menos e não progredir na carreira já passa a servir aos alunos? Já passa a ser competente? Os docentes avaliados com Regular, Bom, Muito Bom ou Excelente terão todos turmas e alunos por igual. O sistema dá-se por satisfeito se pagar menos. Por aqui se vê que o objectivo não é estimular e melhorar a qualidade mas cortar em salários. Mais do que isso, desvalorizar, tecnicizar e desqualificar a profissão docente.

    Vamos assistir a várias perversões, em especial numa cultura como a portuguesa, que não privilegia nem reconhece a competência, mas sim o tráfico de influências e o amiguismo.
    Por outro lado, a competição feroz vai obstaculizar o trabalho de partilha e cooperação nas escolas, importante para a melhoria do trabalho docente e dos alunos. O individualismo puro pode servir a outras profissões, mas não a docência.

    E se um dia houver falta de professores, fazemos como na Inglaterra, que se vai buscar professores de Matemática à Índia, consequência do neoliberalismo de Margaret Thatcher aplicado à educação, nos anos 80. A nossa "ministra de ferro" está ao serviço de uma agenda que não é, propriamente, a educativa.

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  5. Volto a insistir. A distribuição equitativa de salários para professores com competência e empenho distintos, não favorece a melhoria do ensino.
    A retribuição é importante (caso contrário esta polémica não existiria), por isso, todos os professores farão o melhor ao seu alcance para atingir um melhor nível salarial.
    Ao contrário do que diz, considero que a competitividade estimula a criatividade, e não só a inveja.
    Sei também que sem a colaboração dos professores nenhuma politica de educação será viável.

    Um tema que tem sido pouco focado é a qualidade das escolas de educação. Muitas delas são mediocres e preparam mal os futuros professores.

    Certamente que os actuais e futuros professores não têm culpa, mas este ciclo tem de ser quebrado de alguma maneira, e isso só pode ser feito estimulando o esforço de auto-superação de cada professor.

    Deverá também ser estimulada a saída dos maus professores da carreira docente, através de uma real correspondência entre as suas competências e o seu salário.

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  6. A realidade é mais fidedigna (cruel) do que a aplicação simplista (mesmo que, à primeira vista, faça lógica) da teorização sobre as supostas vantagens da aplicação da lei do mercado (livre concorrência, individualismo e competição ferozes) ao ensino e à avaliação dos professores.

    A escola não é uma empresa. Educar não é uma actividade de mercado, embora a queiram mercantilizar. A educação não é um objecto de consumo. Os alunos não são clientes, são pessoas.

    Se o objectivo é premiar os melhores, por que razão os excelentes professores vão ganhar o mesmo que já ganham agora? Que incentivo à melhoria é esse? É um logro. Grande motivação para melhorar o ensino...

    Se o objectivo fosse melhorar o desempenho dos docentes portugueses, bastava criar mais um nível extra, como prémio, ao qual só chegariam os melhores.

    Voltando à questão da realidade, há estudos publicados sobre as consequências das medidas neoliberais, na Educação, dos governos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher. Depois de degradarem a profissão e a carreira docente, bem como o ensino, houve muitos profissionais que abandonaram a profissão (a Inglaterra hoje importa professores...).

    E são os melhores (não os piores ou incompetentes) que, face às poucas oportunidades, perspectivas e realização profissional no ensino, conseguem encontrar outras actividades com maior retorno, noutros sectores. Nos dias que correm, a manifestação do desejo de abandonar o ensino houve-se em cada canto das escolas. E não são os maus professores a dizê-lo... São os bons professores que sentirão a discrepância (e injustiça)entre o seu esforço/competência e o salário/carreira.

    Utilizando uma linguagem de mercado, nem sempre a boa moeda expulsa a má moeda. Mas, uma má ministra conseguirá desmotivar e "expulsar" muitos bons professores do ensino.

    É evidente que a colaboração dos professores, no terreno, é decisiva para o sucesso das reformas. A actual ministra não tem essa colaboração porque não quis: «Perdi os professores mas ganhei a população», disse. Maria de Lurdes Rodrigues pensa que pode implementar reformas contra os docentes, desvalorizando-os, degradando a profissão e criando instâncias coercivas nas escolas para, de cima para baixo, tudo controlar, comandar e obrigar a partir da 5 de Outubro. Está enganada, como iremos perceber.

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