Estava em falta. Já tinha sido interpelado nesse sentido. Contudo, como se confirmaram as eleições regionais antecipadas, a proposta de Estatuto da Carreira Docente da RAM fica em stand by, porque a respectiva lei não pode ser aprovada pela ALM. Há mais tempo para analisar a proposta. Se o processo do ECD regional fica suspenso, fica a dúvida se o ECD nacional se aplica por cá em todo o seu "esplendor"...
Para já, sem mais estudo, e embora alguns aspectos possam ser limados e melhorados, relevo o facto da carreira docente continuar horizontal (não hierarquizada) e os professores progredirem por mérito (não por quotas), o que constitui um melhoramento acentuado face ao ECD nacional. Evolução mais adequada à natureza e circunstâncias do trabalho docente e mais favorável à Educação. Disso não há dúvidas. (E para nem falar na ideia - estou a lembrar-me de José Pacheco - dos professores ganharem todos o mesmo, haver apenas um escalão para não ganharem melhor só no fim da carreira, resolver os casos de incompetência - ausência de predisposição e empenho - com afastamento da docência e não através do castigo na progressão na carreira, porque continuam a ter turmas normalmente - apesar de um salário inferior -, não tendo os alunos culpa das soluções contraditórias do sistema, que favorecem a má educação.)
O Estatuto da Carreira Docente da RAM tem de ser uma oportunidade para servir os interesses da Educação no sentido de se ultrapassarem os resultados escolares negativos que a avaliação externa nacional tem ditado para a Madeira (não esquecendo os resultados ao nível do desenvolvimento pessoal, humano e cidadão dos nossos jovens, que não são medidos/visíveis externamente mas são de capital importância). Se há elevado investimento nos equipamentos e nos recursos humanos na Madeira têm de surgir resultados. É preciso perceber por que razão eles ainda não surgiram. Alguma coisa está a falhar. Todos os intervenientes partilham a sua quota parte de responsabilidade, mas muitas vezes esquecem-se os factores menos visíveis e, sobretudo, sem rosto, que não podemos personalizar e exigir contas. Que custam mais a mudar do que edifícios e recursos humanos.
Refiro-me ao contexto socio-cultural da sociedade madeirense (e da sociedade portuguesa no seu todo): baixas (ou ausência de) qualificações, conservadorismo, insularidade, ruralidade, chagas sociais como o alcoolismo, a violência doméstica ou bolsas de pobreza e analfabetismo (o clássico e o funcional), poucos estímulos para a disciplina, treino, rigor e amadurecimento do raciocínio, escassa cultura de trabalho (empenho), desvalorização do saber e da escola, desigualdade de oportunidades, não privilegiar nem reconhecer da competência, domínio do tráfico de influências em lugar do mérito no acesso ao emprego, entre outros. Se os alunos dos países do Leste europeu têm sucesso e alcançam níveis de aproveitamento escolar bastante exigentes no sistema de ensino português, o que se passa então?
Alguém acredita que os estudantes aprendem em permanente desconcentração, sem trabalho e com atitudes e comportamentos perturbadores do processo de ensino-aprendizagem? Podem ter as melhores escolas e os melhores professores que esses recursos não serão rentabilizados. O problema é então dos estudantes? Não, a responsabilidade é de toda uma sociedade (em que se inclui a comunidade escolar, é claro), que não exige (implementa) uma cultura de disciplina e trabalho, em ambiente educativo de inclusão, cooperação e autonomia dos sujeitos. É a mudança de mentalidades e de cultura que é mais difícil realizar. É essa revolução socio-cultural e cívica que falta acontecer na Madeira. E terá de acontecer por uma questão de sobrevivência. Mais cedo ou mais tarde. E quanto mais tarde pior, apesar de mais valer tarde do que nunca...
Com disciplina e trabalho a aprendizagem acontece, independentemente da metodologia mais tradicional ou progressista, embora as pedagogias estimulem mais ou menos o empenho dos estudantes. O que quero dizer é que a pedagogia facilita (cria condições mais favoráveis) mas, só por si, não pode tudo nem faz milagres. E os professores (não os mercenários que vêem a educação apenas como um emprego de funcionário público), antes do salário assim ou assado, querem é condições de satisfação e realização profissional. Ver o seu trabalho rentabilizado e reconhecido. Ver os jovens progredir, sobretudo aqueles com mais dificuldades ou que partem em desvantagem relativamente à maioria. Porque são esses que preenchem as estatísticas do insucesso e abandono escolares.
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