Khamosh Pani (Águas Silenciosas*) faz-nos chegar à conclusão que as ideologias, bem usadas ou mal usadas, são sempre intolerantes, mesmo que de forma subtil ou a baixa intensidade.
As ideologias exigem todas adesão, incondicional de preferência, para todo o sempre. Todas tentam a sobrevivência, a expansão, o arrebanhamento, a conquista, o domínio, de uma forma mais ou menos subtil, de uma forma mais ou menos violenta (intolerante). Com um fim: o poder.
Convencidos da posse da verdade (para nem falar nos desejos mesquinhos que dominam a natureza humana), os titulares da ideologia convencem-se da bondade, nobreza e elevação das suas acções e estratégias, ao ponto de os fins justificarem os meios. Julgam-se bafejados por uma qualquer divindade e nada os trava.
Como as realidades demonstram, quem não se deixa arrebanhar é para eliminar. Não há espaço para a neutralidade, para a independência, para a não adesão à ideologia, sobretudo a dominante. Quem não se declara a favor é contra. Ou é amigo ou é inimigo. Não é tolerado discordar da ideologia ou dos actos da ideologia.
Mais do que isso, é altamente intolerado não ter nenhuma ideologia pela razão de isso impedir declarar (catalogar) o outro como amigo ou inimigo. Não professar nenhuma ideologia, ter os seus princípios de vida, de convivência humana e pensar pela sua própria cabeça, é a maior afronta às ideologias. As ideologias, bem usadas ou mal usadas, são sempre prepotentes e intolerantes.
Bonita imagem do filme, em território paquistanês.
Por isso, como documenta o filme Khamosh Pani (exibido no Centro das Artes da Calheta) é preciso arrebanhar a juventude, em idade impressionável e voluntarista, para a ideologia. O baptismo tem de ser feito em tenra idade. Daí as mocidades e juventudes para isto e aquilo, disto e daquilo. É preciso acicatar, programar, dominar. É preciso pontas de lança, cães de guarda, futuros cabecilhas da ideologia.
*Khamosh Pani (Águas Silenciosas), estreado em 2003, é um filme paquistanês realizado por Sabiha Sumar e co-produzido com a Alemanha e a França, que tem como pano de fundo aos dramas individuais as convulsões políticas do Paquistão, em 1979. Na sequência do controlo do país pelo general Zia-ul-Haq, é atiçado o nacionalismo islâmico e grupos de fundamentalistas vão impondo, no quotidiano, regras e valores cada vez menos tolerantes, ilustrando as tensões existentes, no Paquistão contemporâneo, entre as comunidades muçulmana e sikh.
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