Se Francisco Louça acredita que «estamos perante uma situação de perda da maioria absoluta» por parte do Partido Socialista e se o Bloco de Esquerda tem programa para governar, não se percebe que, na mesma entrevista ao I, o líder bloquista afirme «Jamais faremos coligações com o PS».
Sonha, por acaso, em ganhar as eleições legislativas? «O que mudou nestes anos foi a possibilidade de com o Bloco de Esquerda, muita gente do PS e com muitos independentes começar a haver uma nova esquerda que surge para poder liderar esse processo e essa alternativa.»
Por outro lado, se não sonha em ganhar as eleições com maioria (muito menos absoluta), por que razão o BE insiste em pôr de parte qualquer coligação com o PS, confinando-se ao bota-abaixo contestatário? «Não iremos [para o governo] com nenhum partido e nenhuma política aos quais nos opomos», esclarece Francisco Louçã, numa clara opção pela oposição às políticas dos outros e não pela tentativa de concretização de algumas políticas próprias.
E porquê? Porque coligar-se implicaria, natural e democraticamente, cedências... «A lógica de coligação é uma lógica de destruição da política, da falsificação das opiniões, de fazer um arranjo de governo.» Trabalho de equipa não é com o Bloco. Será mais adepto das maiorias absolutas do que o próprio José Sócrates. Será mais adepto de uma maioria totalitária?
É, pois, mais fácil contestar (com um punhado de utopias debaixo do braço) do que governar perante as possibilidades oferecidas pelo mundo real. O BE está preso no seu próprio radicalismo, nos seus dogmas.
Pretende o BE um governo minoritário para contestar e causar erosão no parlamento, sem negociar, sem se comprometer minimamente com a governação. Instabilidade e ingovernabilidade para o BE reinar...
Por acaso o BE já sondou o eleitorado de esquerda a ver se este aprovaria ou não um governo de coligação PS-BE?
Qual é o modelo de sociedade que defende o BE? É preciso dizê-lo com clareza aos portugueses. O que faria, por exemplo, com a economia de mercado? Não basta um discurso moderno e radical para governar. Talvez a resposta a estas perguntas seja o que verdadeiramente impossibilita qualquer hipótese de coligação com um partido da área da governação, seja o PS ou outro.
Creio que também não podemos partir de passagens numa entrevista para efectuar extrapolações, se bem que as questões levantadas sejam bem interessantes.
ResponderEliminarO Bloco é um agrupamento político que nasceu há menos de 10 anos e tem trilhado um caminho muito interessante, isto analisando eleitoralmente os seus resultados.
Primeiro do que qualquer outro partido em Portugal, o BE percebeu que o paradigma estava a mudar. A forma habitual e algo redutora da política dentro dos partidos é algo que é cada vez menos apelativa. Numa era onde a imagem impera, o conteúdo deu lugar aos slogans. Hoje em dia, a esmagadora maioria das pessoas vota com base em slogans e em quem mais investe nisso.
O BE sempre primou pela estreita relação com o meios de comunicação, hiperbolizando a sua presença mediática.
A juntar a isto existem mais dois factores: Louçã e toda a aura envolvente e claro a adopção de de uma agenda onde as causas sociais fracturantes imperam.
É precisamente aqui que me foco: ao defender estas causas e ao colocar as mesmas num pedestal, o BE granjea um grande capital de simpatia que extravassa as fronteiras do seu nicho de eleitorado habitual. por outro lado,permite maquilhar as diferenças existentes entre os três movimentos que estiveram na sua origem e que à partida poderia parecer irreconciliáveis. O BE, ao contrário de muitos partidos semelhantes na Europa*, consegue a proeza de ter crescido enormemente, porque soube ler os sinais do eleitorado (numa primeira fase um eleitorado mais urbano e culto que não se revia no centro ou na forma massificada e irredutível do PC; numa segunda fase como estas eleições mostram, alargando-se para todo o país, atingindo boas performances em zonas até aqui desconhecidas ao partido). Esta maleabilidade e esta capacidade de adaptação do BE, explicam em parte o porquê deste súbito crescimento.
Claro que em política, o ideário comum ou o que habitualmente designamos de ideologia é a matriz unificadora de um partido ou agrupamento político. É a espécie de cola que identifica e une o partido em momentos difíceis. Isso visível nas diferenças existentes entre o PS e o PSD, possuindo o primeiro esforço para renovação e construção de massa crítica neste aspecto, enquanto o segundo devido à sua grande eclecticidade tem maiores problemas neste aspecto.
Daí que concorde em parte com o Nélio quando diz que o BE ainda se encontra preso numa lógica de contrapoder. Efectivamente o sucedido na CM Lisboa pode indiciar isso. No entanto a maleabilidade do BE, fazem-me pensar que este partido tem uma enorme capacidade de adaptação. E onde o Nélio vê uma posição irredutível, eu vejo a necessidade de consolidação do nicho de mercado conquistado, antes de se lançar a uma fase mais ambiciosa, onde certamente terá que suavizar a sua posição, de modo a se tornar mais abrangente.