«Sinto o gume frio da navalha até ao osso»
O verso em legenda à fotografia de Adolfo Luxúria Canibal, voz da banda de culto Mão Morta, não é do novo Pesadelo em Peluche, mas sim do Primavera de Destroços, de 2001, que também venero e constitui, para mim, um dos discos mais marcantes da minha vida enquanto melómano.
O novo disco tem outras passagens memoráveis, como este «a morte não é mais do que uma predisposição para a horizontalidade».
No tema O Seio Esquerdo de R.P., com uma deliciosa (inebriante, como dirias tu Rodolfo) linha de baixo, podemos ler: «reconheci o seio esquerdo de r.p., a que a velocidade imprimia convulsões orgásticas de desconhecida intensidade, e as pernas roliças de a.m., em pujantes tesouradas de feroz carnalidade. lembravam uma colecção de fotografias pornográficas, encenadas como memórias seráficas de um pesadelo, com figuras iconográficas - vedetas televisivas, políticos conhecidos - em posições sáficas.»
Ou então, na faixa Metalcarne, «nas filas de veículos ao longo da auto-estrada, as mãos da minha amada afagam-me os testículos. oh deuses, valei-me na tontura! sentindo o pára-arranca com que avança o cortejo, cresce em mim um desejo que nem a morte estanca.»
Ou ainda os versos do tema Estância Balnear: «o ar morno e sufocante penetrava pela janela. toda a instância balnear, esmagada pela quentura, parecia estar deserta. concentrados à beira mar, muitos corpos escaldados estendidos uns sobre os outros como nacos de vianda nos balcões dos supermercados. mais um dia sem demanda neste enfado. mojito, champanhe, margarita para acordar. martini, daiquiri, caipirinha para embalar. pina colada, bloody mary para o deitar.»
Recorde-se:
Tinha saudades tuas, Adolfo (1)
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