Um artigo hoje no Diário de Notícias da Madeira vem muito a propósito e no seguimento do post anterior.
1. O Diário, que fez a primeira notícia (com um sentir muito bairrista por um alegado ataque ao Governo e ao povo madeirense, diga-se), em 11 de Maio, sobre o filme documentário americano "Lost Jewel of the Atlantic", só agora faz eco de uma reacção antiga da Save the Waves, que já anda pela Internet desde 23 de Maio. Portanto datada, em quase um mês.
Faria mais sentido citar a notícia de capa do Tribuna da Madeira, de 9 de Junho, por ser mais recente e ter sido o órgão de comunicação social regional a ouvir, pela primeira vez e de viva voz, uma das partes envolvidas, a Save the Waves, desde a polémica. Ouviram a organização ambientalista depois de ouvir alguém do Governo, o Director Regional do Ambiente, como mandam as regras: ouvir as várias partes, pontos de vista e argumentos.
2. O artigo do Diário agora não está a actualizar nada, quem actualizou foi o Tribuna da Madeira. A "verdade das imagens" não é complementada pela "verdade das palavras" sobre o assunto.
Apenas divulga um vídeo, ver aqui, que é um acto de propaganda. E que não dá novidade nenhuma. Já em Novembro de 2003 o presidente do Governo tinha dito «afinal, há surf no Jardim do Mar», num artigo de opinião. Alguns dias depois, no final do mesmo mês, o Jornal da Madeira fez algumas notícias nesse sentido.
Numa delas citam-se surfistas (a necessária "verdade das palavras"): «Fazer “surf” não é impossível, mas é mais complicado». Reconhece-se que «antes eram excelentes» ou que «antes as ondas rebentavam junto à costa, agora estas rebentam junto aos quebra-mares», o que «se torna muito perigoso». «Por outro lado, entendem que é mais difícil sair da água», porque a «colocação dos quebra-mares e a construção da muralha afectam em parte a prática deste desporto.»
Mais palavras para quê? Estas são a "verdade das palavras" de surfistas escritas pelo Jornal da Madeira de 29 de Novembro de 2003.
3. Os surfistas sabem ler muito bem estas imagens no vídeo agora anunciado e divulgado pelo Diário. Só os leigos pensam que as ondas não foram atingidas, que estão iguais como antes. Tem a vantagem de mostrar imagens aéreas da Grande Muralha. Os surfistas sabem também ler estas imagens, isto é, o impacto de uma construção destas. E a banda sonora do filme é muito grave e séria, mesmo sombria e ameaçadora, como são os cubos Antifer da grande muralha para o surfista a surfar no vídeo. Há verdades em que não há volta a dar. A ondas estão no mesmo sítio, não poderiam fugir, mas as condições únicas passaram à história.
4. Diz-se no Diário que o «filme documental foi divulgado em Espanha e França apesar da intenção do Governo Regional processar os seus divulgadores», que revela um falta de noção da escala e ainda moralismo. Parte-se do pressuposto que a Save the Waves cometeu um crime apenas porque alguém manisfestou a «intenção de processar os seus autores e quem o venha a divulgar.» Deveria a Save the Waves destruir o filme e esconder-se num abrigo anti-nuclear? Já foi julgada e condenada? Com que base? Nem o filme foi visto por cá... não há provas.
5. Diz o artigo: se «se dirigir ao sítio da Internet do Governo Regional (http://www.gov-madeira.pt) à procura de explicações poderá ficar a saber que afinal o enrocamento não causou estragos às grandes ondas do Atlântico através do descarregamento de um pequeno filme da autoria de Rui Martins.»
Como se pode tirar conclusões destas? Que «afinal o enrocamento não causou estragos às grandes ondas»? Quem é dono desta opinião? Se é de opinião deveria estar identificado como tal. E com que base se tem esta opinião? Ouviram-se que surfistas?
Ignora-se que o que esteve sempre em causa foi, note-se, o comprometer e destruir as condições únicas das grandes ondas do Jardim do Mar. Nunca acabar completamente com a existência das ondas. Bem ou mal iriam sempre existir ondas, como é óbvio.
E nunca ninguém disse que não se podia fazer surf. Surf único (de Reis, no Hawai europeu que era o Jardim do Mar) como antes, esse está comprometido, mas é possível fazer surf com muitas restrições: num espaço de tempo bem mais curto (maré baixa, porque a onda fica mais distante da protecção e dos cubos Antifer) e elevada perigosidade por causa desses cubos de cimento da protecção à estrada/promenade. E é muito mais raro agora fazer-se lá surf.
As condições únicas, que tornavam únicas estas ondas no Mundo e levaram o nome do Jardim do Mar e da Madeira a todo o lado, foram de facto comprometidas. Ninguém dá a volta a isto. Nem vídeos nem actos de propaganda. Um conhecido surfista disse uma vez que a onda do Jardim do Mar era como se uma pessoa que se ama tivesse sido violada, mas que não era por ter sido violada que iria deixar de ser amada ou abandonada.
6. Diz ainda o artigo do Diário sobre o vídeo: «com o sugestivo título "A verdade das imagens"». Mais opinião, considerações e mais parcialidade.
7. Esperar-se-ia que fosse o Jornal da Madeira ou o Notícias da Madeira a fazerem este tipo de abordagens.
NOTA:
a) Reduzir as consequências da estrada/promenade/muralha do Jardim do Mar ao aspecto desportivo mais mediático (surf) desvia a atenção dos outros impactos e danos. Que teriam sido evitados (e todos os interesses em jogo conciliados) se tivesse havido o compromisso que foi tentado e pretendido por locais e surfistas - estrada mais estreita, sem entrar em confronto directo com o mar. Só isso. Não era para impedir a obra.
b) Pelo que me é dado a perceber, a Save the Waves e o Jardim do Mar querem os surfistas de volta, apesar dos danos e das limitações na antes famosa (e Real) onda da Ponta Jardim.
Acrescente-se, Rui Martins é só cunhado de AJJ.
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