A nostalgia pelo tempo da infância, que tantos poetas recordam como tempo de especial de felicidade, explica-se de forma simples:
Deve-se à capacidade que têm as crianças de viver o presente. Elas sabem praticar o carpe diem. Convivo com uma criança de três anos para quem o passado, qualquer passado, mais recente ou longínquo é sempre designado de «ontem». Para ela o futuro, qualquer futuro, mais próximo ou distante, é sempre «amanhã». Decorre que o momento presente é vivido em pleno, sem ser minado pelo que aconteceu ou pelo que pode acontecer. As energias estão focadas no agora. Não há derrames energéticos para o passado ou para o futuro. Por isso, não há ansiedade nem nenhum vazio. Se não há ansiedade ou vazio há felicidade.
O adulto desaprende esta capacidade que têm as crianças e ganha muitas vezes uma incapacidade para estar feliz. Boa parte dos adultos, perante a dificuldade (capacidade perdida) de praticar o carpe diem, habitua-se ao mínimo, a estar comodamente infeliz. Conforma-se, deixa-se ficar, nada faz para tomar uma atitude e uma mudança de rumo para melhorar o seu bem-estar e, consequentemente, dos outros à sua volta. O adulto tem de desaprender uma série de coisas, retirar umas camadas de tinta, para deparar-se com o essencial e viver em pleno. Ajuda relativizar e ultrapassar uma série de coisas aparentemente insignificantes, porque é nas pequenas coisas do dia-a-dia que nos tramamos ou nos salvamos (o sentido de salvar aqui é terreno e não bíblico-esotérico).
A gestão emocional é bem mais difícil quando o presente é corrompido por incursões do passado e do futuro. Pela memória e pela antecipação. Não quer dizer que as pessoas tenham de esquecer o que já aconteceu ou o que pode acontecer. Que se tornem irresponsáveis, inconscientes ou negligentes. É apenas saber gerir esse passado e esse futuro de modo a não criar ruído ou matar o presente, o único tempo que existe, que é onde somos ou não felizes. É mais fácil dizer do que praticar, mas pode-se exercitar e aprender para mudar pequenos hábitos perniciosos.
Olhar para momentos felizes do passado pode ser uma consolação, mas não passa disso. E esse passado já foi presente. Viver na esperança que a felicidade chegará um dia é outro paleativo. Interessa não desaproveitar o dia, o presente, para que até cada qual tenha mais memórias de momentos felizes para recordar no futuro, e não se viva à espera de algo transcendente que nunca chega.
A felicidade não é transcendente ou esotérica. É muito terrena e conquista-se a cada momento. Basta estar atento e não confundir o essencial com o acessório para focar as energias.
Ás vezes as pessoas andam atrás de coisas magnânimas, de grandes aparatos, de um tesouro, de um segredo qualquer, para encher o seu cabaz diário de bem-estar e felicidade. É curioso que após conseguir algo dos seus sonhos, ainda antes de a usufruir em pleno, as pessoas estão já a pensar, consumisticamente, numa próxima coisa, a tal que lhes trará, finalmente, prazer e felicidade. Pensam, como vendia a publicidade de um banco, "agora vou ser feliz" porque comprei isto ou aquilo, mas não é assim que funciona embora o mercado nos tente convencer disso de forma tão habilidosa e profissional. As coisas do consumo podem dar conforto, mas de nada valem sem a relação com as outras pessoas, que é quem nos pode encher o tal cabaz que precisamos ter cheio, todos os dias, de gestos de atenção e reconhecimento.
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