«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

sábado, outubro 06, 2007

Professores de luto e em luta 56: Presidente da República lança aviso ao Governo II

António Nóvoa, reputado estudioso em matéria de Educação (autor, por exemplo, do livro Evidente mente, Histórias da Educação), considerou, no Telejornal das 22h da RTP2, o gesto do Presidente da República (PR), no discurso de 5 de Outubro, «muito interessante» e «muito republicano.» E acrescentou: «A República teve um discurso muito retórico sobre a Educação desde o princípio.»

«Aliás, este gesto do PR faz lembrar um pouco o gesto de Manuel de Arriaga, que começou por citar o discurso [em que se dirigia] a um congresso de professores, dizendo que saudava os professores comovidamente e que a “pátria confia em vós”, a “minha soberania é vossa” [em 1912].

«O PR retoma e renova este gesto. Curiosamente, tal como Nicolas Sarkozy em França, no mês passado, escreveu uma carta aos professores, retomando um gesto de 1883 de Jules Ferri. Nota-se, hoje em dia, e isso é muito interessante, na Europa, uma necessidade dos principais responsáveis políticos renovarem o contrato de confiança com os professores

«Temos professores de muita qualidade no sistema de educação português. Mas, curiosamente, e isso é uma coisa que dói um bocadinho a quem gosta do trabalho escolar, são muitas vezes os melhores professores e as melhores escolas que se sentem, hoje em dia, mais atacados e desmoralizados com certas críticas sociais sistemáticas

A jornalista Cecília Carmo questionou António Nóvoa se o discurso do PR não terá sido um aviso ao Governo e às políticas de educação.

«Certamente que sim. Há aqui por parte do PR a vontade de construir algumas pontes políticas. E de construir políticas que tenham a maior estabilidade no tempo. Julgo que é muito importante que se reconstruam as pontes de confiança entre os professores, a sociedade, o Governo. Nós podemos ter muitas opiniões, e é bom que as tenhamos, e perspectivas diferentes mas não podemos viver num clima permanente de suspeição e de crítica permanente.

«O relatório da OCDE 2005 tem como título “Teachers Matter”, os professores contam, são importantes, fazem a diferença. «É preciso dar-lhes mais condições de trabalho e é preciso dar-lhes mais prestígio como diz o PR.

«Não é possível viver cinco, 10, 15, 20 anos em condições muito difíceis dentro das escolas e submetidos a uma permanente crítica social: crítica na Comunicação Social, crítica dos pais, da sociedade inteira. É preciso recuperar aqui um contrato de confiança.

«O professor Cavaco Silva diz que isto não é apenas um problema da escola, não é certamente apenas um problema dos professores, é um problema da sociedade portuguesa e, em primeiro lugar, dos pais e das comunidades [educativas].

«Portugal tem décadas e décadas de uma relativa indiferença em relação à escola. A sociedade portuguesa, desde sempre, nunca foi uma sociedade muito fundada na cultura escolar. [...] Esta resignação da sociedade portuguesa está-nos a custar muito caro. [...] Mas é preciso fazer um esforço muito maior.»

Há o «problema do desinvestimento que está a haver hoje em dia na Educação, tanto na educação básica e secundária, como na educação superior. [Lançou-se] a ideia para a sociedade portuguesa que se gastava demais na Educação para ter fracos resultados. Os fracos resultados é verdade. O investir demais em educação nunca foi verdade em Portugal. Foi verdade durante dois ou três anos. Em 1998, 1999 e 2000 nós aproximámo-nos da média europeia. Em dois séculos Portugal investiu dois ou três anos.

«Estamos sempre aos solavancos. A sociedade portuguesa tem tido uma grande dificuldade em fazer aquele esforço inicial quase de lançar o comboio para que ele atinja uma velocidade de cruzeiro. Parece que estamos sempre num permanente solavanco e que fazermos um pequeno esforço, como estava a dizer, para nos aproximarmos do investimento e a sociedade parece que ficou cansada.

«Nos últimos cinco ou seis anos nós ouvimos milhares de pessoas sucederem-se nos écrans de televisão e nos jornais a dizer que Portugal gastava demais em educação. Não foram um, dois ou três. As nossas elites todas, os nossos colunistas todos, toda a gente veio dizer isso. Essas elites podem estar sossegadas porque no momento em que estão a falar nós estamos outra vez, depois de termos estado dois ou três anos na média, abaixo da média [europeia].

«Não é possível transformar uma situação de atraso de dois séculos sem termos um esforço de alguma continuidade. Nesse sentido, estou inteiramente de acordo com o comentário do Engenheiro José Sócrates, citando aliás uma frase famosa do presidente da Harvard University, quando diz que se pensam que a educação é cara, experimentem quanto é que custa a ignorância. Mas, isto não pode ser só discurso, tem que ser práticas políticas

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