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Numa pequena notícia nas páginas de Economia do Diário local de ontem, a propósito da Associação de Promoção da Madeira (AP-Madeira), Alberto João Jardim demonstra mais uma vez ter um sentido de realismo e pragmatismo na condução de certos assuntos, que se adapta e responde ao contexto socio-cultural e à mentalidade madeirenses.
«Nunca acreditei naquilo [AP-Madeira], porque já sabia que à boa maneira madeirense ia dar nisto [ausência de financiamento privado, entre outras bloqueios], porque já sei que quando há interesses madeirenses diferentes, todos metidos no mesmo saco, sei que isto acaba tudo à bulha e em asneira.»
Três décadas de governo explicam-se também pelo mérito de, há 30 anos, Alberto João Jardim ter sabido ler, com elevada perspicácia, a mentalidade madeirense e ter sabido estruturar uma governação que conseguisse tornar a Madeira governável. O tal evitar da «bulha», sobretudo em período pós-revolucionário.
Na mesma notícia, o presidente do Governo Regional refere que «se por vezes "dou um ar autoritário sem o ser é porque já sei que o caminho às vezes não vai por certas partilhas de decisões, vai é por tomar a decisão e quem a tomou ou bate certo ou bate errado."»
E há coisas que batem mesmo errado. Serão uma espécie de efeitos colaterais da concentração de decisões.
A partilha de decisão e a democraticidade dos processos exigem, pois, maturidade cívica, autonomia e responsabilidade individuais, senão é um desastre. Passa-se o tempo todo a discutir e a ralhar, caindo-se, muitas vezes, em meras lutas de poder e de interesses pessoais e nada acontece.
Reconheço-o com desencanto, porque sempre acreditei nos processos democráticos nas tomadas de decisão, mesmo sendo processos mais lentos e trabalhosos. Estou numa fase de fortes injecções de realidade, que me obrigam a reconhecer que a natureza humana não se lida com idealismo. A utopia como farol para traçar um dado caminho faz sentido, mas, entretanto, no imediato, a realidade exige respostas concretas e funcionais. Enquanto a utopia não se materializa (nem terá de se materializar...) é preciso dar resposta aos problemas de aqui e agora.
Tal como se devem respeitar as leis da Natureza («nós não podemos ir contra as leis da natureza, que são inexoráveis»: Filipe Duarte Santos, cientista, RTP2, 27.11.2007), não se podem esquecer as leis (naturais) do Homem. Alguém pensa que a sociedade deseja pessoas autónomas e livres, capazes de pensar pela sua cabeça?
Os próprios indivíduos não estão assim tão desejosos de liberdade e autonomia como às vezes pode parecer. Porque dá muito trabalho, traz muita responsabilidade individual, exige pensar e decidir por si próprio, traz perturbação ao pensamento.
A maioria quer que alguém ponha pão na mesa e lhes trate da vida. Mais depressa querem espaço e liberdade para fazer o que lhes dá na telha, espaço para o ego crescer sem se importar com os outros, pensando que têm direito a tudo e a exigir tudo dos outros. É a natureza humana. Quantos na História trocaram pão por liberdade? Um punhado de idealistas.
Como diz Rubem Alves, no livro Se eu pudesse viver a minha vida novamente: «toda a gente diz que quer liberdade. É mentira. A liberdade traz muita confusão à cabeça. Melhores são as rotinas que nos livram da maçada de ter que tomar decisões sobre o que fazer com a liberdade. Quem tem rotinas não precisa de tomar decisões. A vida já está decidida. O cavaleiro nem precisa de puxar a rédea: o cavalo sabe o caminho a seguir.»
Excelente post sobre a natureza humana!
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