«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

terça-feira, setembro 16, 2008

Rabaçal em risco V [Rabaçal at risk in Madeira Island] carta de leitor

Levada das 25 Fontes, Rabaçal, zona até onde se pretende levar o teleférico, obra que custará 5 milhões de euros.
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Chegou até mim a seguinte carta de um cidadão, remetida a várias entidades, que se transcreve na integra:
This letter was sent to me and to Madeiran authorities by a citizen concerned with the cable car project for Rabaçal:

«Caro(a)s Senhore(a)s,

Venho por este meio demonstrar a minha apreensão relativamente à construção de um teleférico no Rabaçal.

Sou categoricamente contra.

Sou um Madeirense que embora não viva na Madeira, visito a ilha todos os anos. Como vou de férias quase que posso considerar-me um turista.

Digo isto porque sempre que vou à Madeira um dos sítios que faço questão de ir é ao Rabaçal. Vou lá por ser um vale "selvagem", sem o impacto do Homem ou vestígios de "urbanismos". A "sintonia" com a Natureza que se encontra lá não é fácil de encontrar.

Nas minhas visitas à Madeira, por várias vezes levei amigos/colegas comigo. Também eles salientaram os aspectos que mencionei como sendo o que de melhor tinha o Rabaçal.

Por coincidência, salientaram também o facto de em alguns caminhos estar presente/visível um "tubo" e betão. Se está obra [teleférico] for em frente o impacto do Homem ainda será mais visível.

Portanto, como "turista" e em nome de outros turistas (penso que o Turismo é a actividade que mais dinheiro dá a Madeira), solicito que em vez de um Teleférico reduzam ainda mais o impacto do Homem.

Alguns exemplos:
- "Ocultar" o mais possível os vestígios de Betão [já existentes], ou pelo menos camuflar com pedras;
- "Ocultar", na medida do possível, o "tubo" que alimenta a Hidroeléctrica;
- Desviar este mesmo "tubo", para que este não passe por dentro do túnel do Rabaçal, pois cada vez mais turistas fazem esse percurso;
- Substituir os "corrimões" de metal, que estão ao longo dos caminhos, por "corrimões" madeira (por exemplo, Urzes que é tão característico no Rabaçal);
- Melhorar o caminho para o "Poço do Vento", sem danificar a Natureza, limpando-o melhor e com melhor sinalização;
- Colocar corrimões e melhorar a segurança, para que as pessoas possam "passar por trás do Risco".

Agradeço desde já a atenção,
Nuno Alexandre Araújo Sumares»

Textos anteriores:
Previous posts:

Rabaçal at risk in Madeira Island I
Rabaçal at risk in Madeira Island II
Rabaçal at risk in Madeira Island III
Rabaçal at risk in Madeira Island IV

3 comentários:

  1. Caro Nélio,
    Tenho lido (não todos) os posts sobre o Rabaçal e tenho notado uma predisposição para negar alguns investimentos que venham a mexer na natureza da ilha. Não partilho inteiramente que não se deva avançar com determinadas obras e investimentos, até porque, até agora, os estudos sobre impacto ambiental são inconclusivos. E são porque as melhores instituições que podem promover esses estudos não consideram o interesse ético do ecossistema nos projectos. Se não consideram que certezas temos do real impacto? Uma obra, só por ser obra e artificial não tem necessariamente de alterar todo um ecossistema e pode até contribuir para o seu desenvolvimento. O que para já sabemos, até porque no nosso país essa sensibilidade está pouco desenvolvida, é que os interesses da natureza nunca é considerado num projecto, seja ele qual for. O que assistimos é à visão dos chamados progressistas que defendem o progresso tendo em vista os interesses económicos e os conservadores que ideologicamente se erguem contra qualquer tipo de progresso. Ora, ambas as partes são movidas por interesses, ainda que uns nos pareçam mais jeitosos que outros, mas nenhuma dessas partes está genuinamente interessada na verdade defendida honestamente. Não tenho razões para ser contra uma obra somente porque é uma obra. Quando construímos uma casa temos em consideração o nosso interesse (que seja segura, cómoda, bonita, etc.). O que estou a propor é que, quando construímos uma barragem ou um teleférico, tenhamos em consideração os interesses morais do ecossistema. Pode-se objectar que o ecossistema não possui consciência, pelo que não possui interesses. Isto é falso porque 1) se se tratar de seres animais (coelhos, raposas, aves, etc.) certamente o interesse a considerar é o do sofrimento e de poupar estas espécies ao sofrimento; 2) se se trata de seres vegetais podemos pensar o mesmo, que não existe interesse em sacrificar uma vegetação em proveito económico e turístico. Conclusão: quando pensamos numa obra e na ameaça ao ecossistema estamos a colocar um problema moral, por essa razão é que é estúpido pensar que somente os engenheiros e os ecologistas é que tem uma palavra a dizer sobre o assunto. Isso é o mesmo que pensar que sobre o aborto só os padres e as feministas é que estão habilitados a falar. Infelizmente a opinião pública é o que pensa e no nosso país o debate passa-se só com esses . mas por essa razão é que raramente é um debate, pois um padre não está disposto a colocar em jogo os seus argumento, tal como uma feminista. O mesmo se passa entre um engenheiro de obras e um ecologista. E este é um assunto que se resolve argumentando, já que não é construindo e destruindo, isto é, experimentando que sabemos qual o melhor caminho a seguir.
    Espero ter dado um contributo útil
    abraço

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  2. Obrigado pelo comentário, que aproveito para esclarecer ou balizar a minha posição.

    Não defendo a ideia do progresso em abstracto (como se fosse sempre necessariamente bom e positivo) nem a natureza virgem. As obras não são sempre negativas à partida. Não faz sentido.

    Não me causa problema as intervenções na natureza, desde que justificadas pelo interesse público e bem comum e se harmonizem com a natureza, isto é, não comprometam a experiência da nossa relação com o espaço natural.

    Ora, a Madeira já tem demasiados exemplos em que essa harmonia ou equilíbrio não existe. Equilíbrio entre progresso e perservação da natureza, entre exotismo (autenticidade) e sofisticação (artifialização para sobrevivência do homem).

    O estudo sério e independente que há tempos foi publicado pela National Geographic sobre as melhores ilhas turísticas no mundo disse muita coisa. A Madeira ficou em 70º lugar enquanto ilhas como os Açores ficaram em 2º lugar: recordar aqui.

    O lado positivo do teleférico no Rabaçal é ínfimo face aos aspectos negativos, a julgar por tudo o que li.

    O Rabaçal já tem lá casas e tem uma estrada de alcatrão. Tem levadas construídas pelo homem. Não é virgem. Mas é diferente do que se pretende, que é um acto de violação do Rabaçal. Não é uma intervenção de pouca monta.

    Por algum motivo se vedou o acesso de carros particulares ao Rabaçal e optou-se pelo transporte colectivo e selectivo. Agora quer-se fazer o oposto. Estranhos desígnios...

    Ainda por cima para despejar, em cada hora, 240 turistas. Quem vai ao Rabaçal procura um contacto próximo com a natureza e não com multidões a palmilhar o sítio em cada canto ou a tomar um whisky num cubo de betão envidraçado.

    Como não faz sentido, num ilha exótica, exuberante e luxuriante como a nossa, trocar ou anular a nossa exuberância natural, fundamental para o turista que nos procura, por praias artificiais, autênticos poços rodeados de milhares de antifers, em enrocamentos grotescos, com um impacto visual tremendo, que nem deixam ver o horizonte. E que custam dinheiro para manter.

    Se alguém me quiser dar um tiro, não é razoável que negoceie com o agressor e acabe aceitando, por exemplo, umas ou duas facadas ou então um par de socos... Não quero é ser vítima de qualquer agressão, mais pesada ou menos pesada.

    Saudações.

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  3. Pois é trata-se de uma questão de vida ou morte!Este teleférico é a morte do que se entende por Rabaçal, "mata-sa o Rabaçal em função daquilo que se acha "chic", giro ou na moda. Por "muitos Rabaçais" que houvessem este projecto ser proveitoso ou vantajoso do ponto de vista económico para a Madeira? não! Eu nao creio! Ao facto de não representar um retorno financeiro justificável tal atentado, questiono uma eventual viabilidade deste projecto a longo prazo visto pedirem-se fortunas para os investidores/concessionários para explorarem os espaços detidos por sociedades extranguladoras e liquidadores de balúrdios provenientes do erário público. Se outrora fui céptico quanto a este projecto, visto descrer no interesse governamental futuro noutros sectores económicos; hoje em dia, depois de uma reflexão dou por mim a concluir que a imagem de marca que é o Rabaçal é muito melhor para todos tal como ele está e deve continuar a estar estou e sou completamente contra.

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