«- Que diabo de vingança poderá ser a nossa - respondeu Sancho -, se eles são mais de vinte e nós só dois, e até talvez nós só um e meio?
- Eu valho por um cento - replicou D. Quixote.
E, sem fazer mais discursos, lançou a mão à espada e arremeteu contra os galegos, e o mesmo fez Sancho Pança, incitado e levado pelo exemplo do amo.»
«Os galegos, que se viram maltratados por aqueles dois homens, sendo eles tantos, acorreram com os seus paus, e, cercando os dois, desataram todos a bater-lhes com grande afinco e veemência. É verdade que à segunda pancada atiraram Sancho ao chão, e o mesmo aconteceu a D. Quixote, sem que lhe valesse a sua destreza e grande coragem.»
«O primeiro a queixar-se foi Sancho Pança; e, achando-se perto do seu senhor, com voz enfermiça e queixosa, disse:
- Senhor D. Quixote! Ah, senhor D. Quixote!»
«- Senhor, eu sou um homem pacífico, manso, sossegado e não sei fazer caso de qualquer injúria, porque tenho mulher e filhos para sustentar e criar. Assim, sirva também para vossa mercê de aviso, já que não pode ser uma ordem, que de maneira nenhuma levarei as mãos à espada, nem contra vilão nem contra cavaleiro; e que, desde agora até à hora da minha morte, perdoo todas as ofensas que já me fizeram e me hão-de fazer, quer mas tenha feito ou faça ou venha a fazer qualquer pessoa nobre ou plebeia, rica ou pobre, fidalgo ou que tenha de pagar impostos, sem exceptuar nenhum estado ou condição.»
(Continua em próximo post)
Miguel de Cervantes: O Engenhoso Fidalgo D. Quixote de la Mancha: Relógio D'Água: Maio de 2005 (obra originalmente editada em 1605): tradução e notas de José Bento: páginas 122-123.
D. Quixote de la Mancha (1)
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