Não há dúvida que existem anticorpos e ódiozinhos relativamente ao Executivo regional, personalizados na pessoa do presidente do Governo. A maioria absoluta de lá permite e gera determinados discursos e atitudes mais duras dirigidas a outra maioria absoluta veterana, com 30 anos, que foi deixando a sua história de excessos à mistura com a combatitividade e aspirações legítimas da Autonomia madeirense. Estes poderes absolutos são passíveis de gerar mais algumas faíscas... e excessos. O poder absoluto atenua os mecanismos de auto-controlo.
Sabemos o que significam 30 anos de maiorias absolutas. Na Madeira, esmagam-se as minorias, o pensamento alternativo, as ideias diferentes e dissonantes. Quem não alinha com o directório e se desvia um milímetro que seja tem um preço elevado a pagar. E foram-se gerando raivas e rancores difíceis de ultrapassar. Houve muita gente perseguida, humilhada e espezinhada nestas três décadas. Há sentimentos difíceis de serenar. No entanto, este estado de coisas não legitimará tudo. Pelo meio, a Autonomia regional pode sofrer um revés com a nova LFRA. A população madeirense pode ser prejudicada na ânsia de se maneatar (e abater) o poder absoluto regional e os seus tiques de prepotência e arrogância.
Parece que a situação financeira do país não justificará, na totalidade, certos avanços e soluções da Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Estará o rigor das finanças públicas a ser confundido, de forma oportunista, com cortes deliberados à RAM? Cortes que podem fazer retroceder algumas conquistas autonómicas?
Sabemos que algumas posturas e políticas do Governo Regional acabaram por dar alguns argumentos ao apertar da relação financeira com a Região. O empolamento do PIB é um exemplo. Já fez a Madeira perder 500 milhões no próximo quadro comunitário. Decidimos ser o aluno bem comportado, que soube aplicar bem as lições e obter bons resultados, mas escondeu as dificuldades que ainda se mantêm, dispensando certas ajudas europeias que não poderiam ser dispensadas ainda. Há atrasos que não foram recuperados. Há bolsas de pobreza, a economia continua basicamente (e cada vez mais, pelos vistos) dependente do turismo, o nível de qualificação é mais baixo do que a média nacional e os resultados escolares entre os mais deprimidos do território nacional. Há um desenvolvimento humano e cultural insuficiente.
Assumindo o PIB com o Centro Internacional de Negócios pelo meio a Madeira é a segunda entre as 7 regiões do país. Contudo, pelo poder de compra concelhio é quinta entre 7; pelas receitas e despesas dos agregados domésticos a Madeira vai para último lugar das 7 regiões. O estudo Mateus, encomendado pelo Governo Regional, ainda diz que a Região «surge no quadro dos indicadores de conforto das famílias como a Região menos desenvolvida do país.» Como se não bastasse, a Madeira é ainda campeã na «desigualdade na repartição regional do rendimento».
O Governo da República sabe que o PIB regional não corresponde à realidade, mas insiste em alinhar por esse indicador de riqueza que não corresponde às condições de vida da esmagadora maioria dos madeirenses, que têm dos mais baixos poderes de compra do país.
O Governo Regional e ainda o PS-Madeira procuraram desmontar o PIB:
- Quando «questionado sobre a tese do PS-M de que o PIB madeirense está inflacionado pela Zona Franca, Teixeira dos Santos considerou o argumento «falacioso». Pelo que aqui não deverá ocorrer nenhuma mexida», lê-se no Diário (5.10.2006).
- O Diário (2.10.2006) deu conta que o Governo Regional sugeriu mesmo o «recurso a um novo indicador, o poder de compra», em «substituição do critério do PIB», na revisão da Lei de Finanças Regionais. «Segundo evoca o Governo Regional, a circunstância do poder de compra dos madeirenses ser um dos mais baixos do país é razão mais do que suficiente para o Estado estar atento a esta dificuldade.»
Mas nada. O Governo da República mostra-se intransigente e escuda-se no PIB empolado, bem como na dívida "escondida", em certo despesismo da gestão regional e na postura política de alguns actores do executivo regional, para justificar os cortes. O discurso de Sócrates do passado dia 7 destinou-se a reforçar estes argumentos e fragilizar Marques Mendes. Tanto assim que, no mesmo dia do discurso demolidor contra o Executivo regional e contra Jardim, quando questionado pelos jornalistas, o primeiro-ministro voltou a utilizar o argumento de que a Madeira tinha um nível de riqueza acima da média do país, pelo que não poderia receber as mesmas verbas. Apesar de saber que essa riqueza está mistificada.
Há uma intencionalidade. Um ajustar de contas com os excessos do Executivo regional, que terão ultrapassado, em muitas ocasiões, o justo e legítimo combate pela Autonomia ante o centralismo endémico do Estado. Todavia, mesmo que se discorde do estilo, dos métodos, da estratégia e do modelo de desenvolvimento, Alberto João Jardim precisou de um braço-de-ferro para conseguir vantagens para a Madeira nos pós-25 de Abril. A Madeira e a Autonomia parecem correr o risco que assistir a retrocessos devido às novas regras da relação financeira com o Estado.
A ver vamos. Estamos cada vez mais próximos das conclusões finais, agora que ambos os lados têm pareceres contraditórios de constitucionalistas. Pode até acontecer que tudo seja legal e constitucional quanto ao articulado da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, mas não quer dizer, necessariamente, que seja justo ou que não implique um retrocesso em termos autonómicos. "Paz Ferreira ["pai" da Lei de Finanças Regionais], como deu conta o Diário de Notícias da Madeira (7.10.2006), considera haver «evidentes desconformidades» entre o que está no Estatuto [Político Administrativo da Madeira] e aquilo que quer o Governo de Sócrates", na nova LFRA.
Como já se disse no post anterior, como fazer valer, então, a posição da Madeira, se o TC não nos der razão? É nessa estratégia política que é preciso investir, que não pode passar por ameaças de separatismo ou outros exageros. É preciso desmontar os argumentos com factos e números, na linha do que fez o presidente do Governo Regional na Grande Entrevista, e provar, perante a opinião pública portuguesa, a alegada injusta penalização da Madeira e da sua Autonomia. O que não é fácil pelos argumentos que fomos dando ao adversário e pelos anticorpos - e má imagem - que certa actuação política regional gerou ao longo dos anos. A reacção madeirense corre o risco de ser vista como mais uma das reacções excessivas habituais... Provar que há um ataque político ao Executivo regional será ainda bem mais difícil pela subjectividade da questão, embora o discurso de Sócrates da útima segunda-feira tenha sido esclarecedor.
-Sócrates em bombardeamento surpresa, à Pearl Harbor
-O outro lado do belicismo de Sócrates contra Alberto João Jardim
-Outros tiros na sequência do ataque de Sócrates ao Executivo regional e a Jardim
-Madeira & República XVIII: Mais pareceres sobre a LFRA
"Ele" sempre se manifestou contra o positivismo do sistema político português (primado da lei sobre a política)pelo que tem a fazer é argumentar que quer mais dinheiro em vez de fingir que a lei está do seu lado. Na Madeira sempre se violou a lei nas relações entre o governo regional e as autarquias...se havia alguma ilegalidade os tribunais não tinham nada a ver com o assunto...o julgamento seria feito nas urnas...simplificando este é o ideal de democracia do "Senhor"...um político desonesto mas exímio manipulador das massas nunca devia ser sugeito à lei...o povo esclarecido seria o supremo juiz...de 4 em 4 anos...
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