Não há como um telefonemazinho para ajeitar as coisas à nossa vontade. Quem pode, pode. (Copyright: Quino,"Potentes, prepotentes e impotentes", Teorema 2004).
Bill Kovach, jornalista há 50 anos, disse recentemente: «Acredito piamente que sem bons jornalistas não há democracia» (VISÃO 29.03.2007). E explica porquê: «Sem uma imprensa credível e independente não pode haver uma opinião pública forte, que saiba exigir dos governantes aquilo que quer para a sua vida.» Isto é, a democracia perde sem a informação fidedigna e essencial para os cidadãos poderem ter um papel e uma palavra a dizer quanto à condução dos destinos públicos.
Ter uma opinião pública bem informada, exigente face à acção governativa e capaz de tomar parte nos assuntos públicos que lhe diz directamente respeito não é cómodo para o poder. O poder é, naturalmente, prepotente e expansivo: na sua óptica nunca domina o suficiente. Aspira sempre a mais e mais. O poder não tolera a crítica ou qualquer sombra que esponha a suas fragilidades, erros e contradições. Na realidade, não interessa discutir e debater mas sim conseguir a submissão do outro.
Isto a propósito das noticiadas tentações da maioria absoluta de José Sócrates dominar e controlar a informação, na forma de telefonemas para a redacções com o objectivo claro e admitido de influenciar a informação difundida pelos órgãos de comunicação social. O que é contraditório com o facto de ser o mesmo governo que quer clarificar (moralizar) a situação do Jornal da Madeira, com capitais públicos, na defesa da pluralidade e da independência. O PS-M é arrastado por essa contradição, já que tem denunciado a falta de pluralidade e os gastos públicos do jornal financiado pelo Governo Regional.
Se uma maioria absoluta com pouco mais de um ano de idade já se incomoda tanto com a informação, imagine-se se tivesse o à vontade de décadas?
Contraditório é ver também os social-democratas nacionais a "bater" no Governo da República e fechar os olhos a casos como o Jornal da Madeira e às alegadas pressões e represálias, na ilha, sobre jornalistas e redacções, de acordo com aquilo que o Diário deu conta na edição de 7 de Abril: "Os métodos são realmente subtis e 'rafiné'. O poder nunca telefona directamente, manda um assessor ou um comissário político telefonar ao editor ou ao director. São estes que, depois, fazem a pressão sobre o jornalista, que ameaçam ou colocam na prateleira".
No meio disto tudo, o jornalismo tem de dar a volta por cima através do trabalho com rigor e excelência. O jornalista não é um repetidor acéfalo ou uma mera correia de transmissão de actos e posições alheios. Tem de haver esforço de interpretação, de constextualização, de aprofundamento, de memória, de descodificação e desmontagem (rigorosa e objectiva) dos factos - diferente de opinar - com os olhos postos na salvaguarda do direito que tem o público à informação, sem subterfúgios. O leitor tem de ficar ao corrente de tudo o que está subjacente a um assunto e não apenas assistir ao que dizem as várias partes num dado momento. Nada garante que o interesse dessas partes seja esclarecer o público com a realidade e a verdade das coisas. A inteligência e a competência do jornalista e da comunicação social tem de estar ao serviço dessa realidade e dessa verdade dos factos. Por vezes é preciso dar um murro na mesa e dizer que o rei vai nu.
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