«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

quarta-feira, agosto 29, 2007

Renovada promessa de competição de surf na Ponta Jardim (actualizado 2SET2007)

Procura-se convencer a opinião pública que as condições únicas da onda da Ponta Jardim não foram comprometidas com a construção: que serão, alegadamente, as «mesmas», «óptimas» e até «melhores».

Não seria uma afronta pedir aos próprios surfistas, ostracizados por entidades regionais, que agora organizem e viabilizem uma competição mundial, a pedido dessas entidades, para fins políticos?

Para os próprios surfistas negarem a realidade e provarem que são ineptos ou que as condições únicas da Ponta Jardim não foram comprometidas? Dizerem, ao fim ao cabo, que a luta que os surfistas e ambientalistas desenvolveram não teve razão de ser?

Oxalá uma competição mundial de surf voltasse a realizar-se no Jardim do Mar, mais especificamente na Ponta Jardim (ler mais adiante).

Recorde-se que há um ano havia sido feita a promessa, mas que não se concretizou, com certeza por alguma boa razão, de realizar-se uma competição. A promessa terá sido reeditada na passada segunda-feira por um responsável da autarquia calhetense aos microfones da Rádio Calheta, segundo um ouvinte nos relatou.

Seria a primeira competição de surf a ter lugar na Ponta Jardim desde há sete anos (2000) e três anos após a inauguração da promenade/paredão. Ajudaria a defender o desporto, promoveria a Madeira e animaria a economia local.

É salutar se há uma mudança de atitude face à prática do surf e aos dividendos que este nicho de mercado turístico traz para a Calheta e para outras localidades da Madeira.

PRIMEIRO:
Contudo, tal pode ser comprometido se se cometer o erro de se promover, simultaneamente, uma competição de nível mundial na Ponta Jardim (como o Madeira Big Wave Team Challenge, em 2000: Cass Collier recebe o troféu na imagem deste post) e uma agenda política.

No sentido de procurar, apenas ou sobretudo, convencer a opinião pública que as condições únicas da onda da Ponta Jardim não foram comprometidas com a construção: que serão, alegadamente, as «mesmas», «óptimas» e até «melhores».

A iniciativa seria fugaz e teria efeitos perversos. No fundo, não se voltaria a reconhecer o potencial económico, desportivo e de promoção da Madeira por via do surf. Não contribuiria para enterrar o machado de guerra sobre esta questão, apesar de as entidades regionais terem vencido, terem feito todas as obras que pretendiam na costa e os surfistas terem perdido essa luta e sido humilhados.

É uma óptima notícia que se queiram realizar competições mundiais se surf na Ponta Jardim, mas é condenável, além de ser um erro estratégico, qualquer aproveitamento ou instrumentalização com fins políticos. Seria oportunismo e interesse passageiro. Seria mesmo uma afronta relativamente aos surfistas.

Até 2001/2002 o surf foi usado para promover locais e personalidades. Depois passaram, num ápice, de bestiais a bestas. Agora, quer-se usar o surf e os surfistas de novo, para ganho de quem os ostracizou anti-democraticamente.

SEGUNDO:
Como já se disse, mesmo que se realize uma competição internacional, não fica provado que as «mesmas» condições se mantêm nem que são melhores. Apenas se provaria que se pode fazer uma competição, mas as competições podem realizar-se em condições imperfeitas. Recorde-se o estado precário do relvado no mais recente jogo da selecção portuguesa na Arménia, a contar, note-se, para o Campeonato do Mundo. O jogo realizou-se, apesar das condições serem más.

Apesar dos danos significativos nas condições únicas da onda da Ponta Jardim, da sua actual maior perigosidade, das limitações no tempo para surfar e da paisagem danificada (artificializada) pouco interessante para filmagens, as autoridades governativas podem até investir elevadas quantias do dinheiro dos contribuintes para atrair surfistas de topo a uma competição de nível mundial na Ponta Jardim.

Será possível encontrar surfistas que, pela fama e pelo valor dos prémios, estejam dispostos a correr riscos, a ultrapassar mesmos os limites da sua segurança pessoal.

TERCEIRO:
Não se pode deixar de referir que se trata de uma contradição com os actos do passado recente, em que se correram com os surfistas da freguesia quando estes procuraram, em 9 de Novembro de 2002, debater com a população alternativas menos radicais para a muralha de protecção. Defendia-se uma promenade mais estreita, sem enterrar toda a praia de calhau ao longo de quase 800 metros e sem invadir o mar com milhares de quebra-mares (antifers).

É contraditório que aqueles que, activamente ou no silêncio, combateram a livre expressão e participação dos surfistas, que lhes chamaram tantos nomes, que os escorraçaram e apuparam, que os difamaram, que promoveram uma campanha de ódio e hostilidade perversas, que desprezaram e negaram o peso turístico e económico do surf, que destruíram e comprometeram ondas, venham agora convidar os surfistas para fazer o "jeitinho" de viabilizarem uma competição.

Pede-se aos próprios surfistas que se considerem ineptos e viabilizem os objectivos políticos de quem os ostracizou.

Pede-se aos surfistas e ambientalistas que colaborem no sentido de negar que as condições únicas da Ponta Jardim foram comprometidas. Que a luta que surfistas e ambientalistas desenvolveram não teve razão de ser. Que estavam redondamente enganados e errados.

Não seria melhor deixar os surfistas organizarem as competições de forma espontânea, consoante o próprio calendário desportivo, as condições das ondas e o mercado da modalidade? As entidades governamentais poderiam decidir apoiar ou não certos eventos, se lhes fosse solicitado. Porquê engrandecer a imagem dos políticos que lhes chamaram nomes e os ostracizaram há alguns anos?

Bem gostariam os surfistas de poder realizar competições na Ponta Jardim. Se as competições não se realizam não será por falta de vontade e interesse dos surfistas. Quanto muito por falta das condições que antes existiam.

Fazemos votos que as opiniões das entidades da Região evoluam, embora o mal já tenha sido feito. Veremos o que acontece nos próximos tempos. Se se pretende promover mais batalhas campais e polémicas ou se, pelo contrário, pacificar a relação com o surf, para benefício de todos.

Se os políticos madeirenses querem, efectivamente, agradar aos surfistas, apoiá-los e serem benevolentes e proactivos, há algo simples a fazer: repor as condições antes existentes no Lugar de Baixo, Ponta Jardim e Ponta Delgada e evitar a destruição ou danificação de outras ondas surfáveis. De longe mais importante do que promover competições para servir uma agenda política...

Recorde-se:

- Câmara da Calheta quer surf de volta II: motivação e realidade
- Save The Waves promove estudo sobre o mercado turístico do surf (bilingual)
- Surf promovido na montra de Turismo da Madeira
- Surf, turismo de pata-rapada?...
- Câmara da Calheta quer surf de volta I: campeonato mundial na Ponta Jardim
- Surf faz parte do Plano de Desenvolvimento 2007-2013 da Madeira
- El Salvador aposta no surf para reanimar economia
- Indústria do Surf com significativo impacto económico em Portugal
- Governo insiste que surf está igual ou até melhor: vamos aos FACTOS
- Interessa? Não interessa? Decidam-se II
- Interessa? Não interessa? Os privados já decidiram III
- Interessa? Não interessa? Outro exemplo como sim IV

(Photo copyright (c) Shawn Alladio)

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