«And some people say that it's just rock 'n' roll. Oh but it gets you right down to your soul» NICK CAVE

segunda-feira, julho 14, 2008

«Apostar a sério na Educação», para quando?

Entre 97 e 2004, em plena euforia do progresso regional, 71% dos jovens ficaram sem ensino secundário, mais um dado que ilustra o nível das qualificações dos madeirenses. Como é possível, num mundo globalizado, sonhar-se com a auto-sustentação económica da Madeira sem quadros altamente qualificados?

«71% [114 mil] sem ensino secundário» é um título do Diário de hoje. Um quadro negro para uma Região que pretende apostar em áreas da economia que exigem elevadas qualificações dos recursos humanos.

Com estas qualificações como poderemos aspirar a uma economia regional auto-sustentada? Como poderemos aspirar à auto-suficiência?

A notícia adianta ainda que «apenas 29% do total dos jovens madeirenses concluíram o ensino secundário com sucesso [entre 1997 e 2004]. "Estamos muito atrás da média europeia, que ronda os 55%", sublinha a investigadora Liliana Rodrigues, do Centro de Investigação em Educação da Universidade da Madeira (CIE-UMa).

Estes dados provam o que já se sabe. O desenvolvimento da Madeira, nos últimos 30 anos, assentou sobretudo numa política de desenvolvimento de infraestururas e no bem-estar material [ver mais aqui].

Sem os fundos e consequente investimento público depressa voltámos aos números do desemprego dos anos 70. Com a diferença que a Região está mais endividada, perdeu fundos europeus e do Estado e foram criadas determinadas expectativas de progresso e bem-estar, que poderemos não conseguir manter.

Nas comemorações do dia da nossa Região, o Diário deu conta que, «para [o social-democrata Álvaro Monjardino], antigo presidente do parlamento dos Açores, a Autonomia tem ainda um passo a dar, que é o da autosustentação económica. Para lá chegar, em vez de alterações constitucionais, há que apostar a sério na educação e repensar o papel do Estado na economia. Sobre este último aspecto, falou na necessidade dos governos deixarem de se comportar como "tutores" e "suseranos" e se limitarem a um papel de regulação do mercado, deixando à iniciativa privada o papel principal.»

Ora, não é isto que a Madeira tem feito. Foi preciso vir um açoriano dizer que o rei vai nu. Também na Educação optámos por priorizar o mais fácil e mais visível, a construção de infra-estruturas e não os recursos humanos, o oposto do exemplo Irlandês. Continua a faltar a revolução cultural e de mentalidades.

Temos uma sociedade civil dependente, infantilizada, anquilosada, fechada, acrítica, sem iniciativa (capacidade empreendedora), sempre expectante e à espera que alguém lhe diga o que fazer e lhe coloque o pão na mesa (ver mais aqui).

A sociedade madeirense não é fundada na cultural escolar, que é desvalorizada em largos sectores, tornando difícil vencer séculos de atraso sem uma política continuada de maior investimento na Educação. Por isso a Educação deveria ter merecido uma maior fatia do orçamento regional, ser a prioridade da sociedade madeirense desde a década de 70.

Relembro António Nóvoa quanto ao «problema do desinvestimento que está a haver hoje em dia na Educação, tanto na educação básica e secundária, como na educação superior. [Lançou-se] a ideia para a sociedade portuguesa que se gastava demais na Educação para ter fracos resultados. Os fracos resultados é verdade. O investir demais em educação nunca foi verdade em Portugal. Foi verdade durante dois ou três anos. Em 1998, 1999 e 2000 nós aproximámo-nos da média europeia. Em dois séculos Portugal investiu dois ou três anos

E depressa a sociedade portuguesa se cansou desse pequeno esforço. Toca então a desinvestir na Educação. Parece que a Educação é um fardo, uma fonte inútil de despesa. É pouco compensador em termos eleitoralistas e não se obtém resultados imediatos no período de uma legislatura...

Nas escolas, tenho como referência sobretudo o 2º e 3º ciclos, os estudantes vivem na indisciplina e com uma atitude negativa perante o trabalho intelectual e escolar. Mesmo podendo transitar de ano com três níveis inferiores a três, é elevado o insucesso escolar.

Numa terra em que se apregoa tanto o «conceito de disciplina democrática» não se percebe o porquê de tanta indisciplina nas escolas, que é a ruina do processo de ensino-aprendizagem e coloca em causa o direito dos restantes alunos à aprendizagem. Há um autismo impressionante. Sempre para salvar as aparências.

Como se pode aprender sem disciplina e trabalho? Há alguma outra fórmula de sucesso? (Só se for o sistema de cunhas e compadrio - do não mérito - em que alguns jovens apostam em alternativa à qualificação, ao mérito e ao trabalho).

Toda agente ficou escandalizada com os adolescentes que atacavam e humilhavam pessoas em espaços públicos do Funchal, como recentemente denunciado pelo Diário. Mas ninguém se escandaliza e toma medidas quando a indisciplina e a violência toma conta das salas de aula. Está longe da vista... Será preciso aparecer no You Tube?

Recorde-se:
Como melhorar o sucesso escolar na Madeira?

Insucesso escolar vem de longe 1
Insucesso escolar vem de longe 2
Insucesso escolar vem de longe 3

Elementos sobre o estado da Escola Pública 7: violência camuflada I
Elementos sobre o estado da Escola Pública 12: violência camuflada II
Elementos sobre o estado da Escola Pública 13: violência camuflada III

Ainda a propósito:
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 1: condições de trabalho
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 2: a mais grave discriminação
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 3: primeira responsabilidade
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 4: manobra para a estatística I
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 5: manobra para a estatística II
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 6: manobra para a estatística III
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 7: violência camuflada I
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 8: manobra para a estatística IV
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 9: nem ditadura por disciplina nem a ditadura da indisciplina
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 10: educação infantil em Portugal (Eduardo Lourenço)
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 11: racionalidade e realismo precisam-se-Elementos sobre o estado da Escola Pública 12: violência camuflada II
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 13: violência camuflada III
-Elementos sobre o estado da Escola Pública 14: diploma universitário à nascença resolvia problemas da Educação

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